Antônio, o profissional tímido

o profissional timido

Antônio trouxe a conta. Lá embaixo estava escrito com sua letra meio garranchuda o valor dos 10%. 11,90 ele ganharia por ter nos atendido. Por sinal, atendeu bem. Trouxe tudo rápido, estava sempre por perto, se fez presente quando dissemos que íamos tomar banho de mar e a mesa ficaria sozinha.

Antônio tinha feito um bom trabalho – trouxe as melhores águas de côco, quebrou o côco depois, trouxe o caranguejo no timing certo – , merecia até mais que 11,90.

Puxei assunto com Antônio sobre como ele ganhava, se ele tinha emprego na barrada. Não havia empresa. Ele ganhava apenas os 10% e ao final do mês ganhava 3% sobre o que vendia. Já fiz a conta na cabeça e quis saber sobre quanto ele costumava vender durante um dia de trabalho. 2 mil reais por dia. Ele não falou, mas eu entendi que não eram todos os dias. Afinal, a barraca só bombava em final de semana e feriados.

3120 era o Antônio deveria ganhar ali. Fiquei animada. Que legal! Que bom! Mas ai ele foi explicar que nem todo mundo pagava os 10%. “A maioria paga?” Ele disse que sim. Depois disse que não, que a metade pagava. OU seja, 1660. Não, não era bom. Quis ajudar.

Ele terceirizou o problema para a cozinha, disse que quando a comida vinha fria, as pessoas não pagavam os 10%. Caminho imediato que quase todos tomamos quando estamos diante da explicação de nosso desempenho. Parece até ser biológico: a gente ta sempre buscando culpados. É impressionante.

Naquele momento, Antônio já era chapa. E vi que ele baixou a guarda totalmente, se conectou de imediato quando eu disse: “eu vi que você é tímido, né?” Ele respondeu: “muito tímido”, e soltou um sorriso. “Mas é muito eficiente, trabalha focado.” Ele sorriu.

“Por que você não tenta um experimento? Hoje, que é feriado, por que você não faz uma coisinha diferente e vê se melhora o seu dinheiro?” Aí comecei a consultoria que Antônio não pediu, mas que a conexão que estava ali consolidada entre eu e ele me despertou quase que involuntariamente.

Sugeri que Antônio já explicasse no início do atendimento que ele ganhava pelos 10%, que ia fazer de tudo pra honrar esse valor no atendimento a mesa. Uma técnica simples de comprometimento dele e sensibilização dos seus clientes.

Antônio retrucou. Disse que era tímido, que não ia dar certo com ele não. Fui na linha da motivação: mas você não se garante, não? Ele retrucou denovo. Não deu certo.

“Mas o que você tem a perder se tentar, apenas hoje, fazer isso? Se não der certo, amanhã você para de fazer.” João silenciou.

Fui embora. Não sei o que ele tirou da nossa troca. Palpitaria dizer que ele ficou com a emoção de ter sido percebido com a sua maior dificuldade: ser tímido e ter que ganhar a vida num trabalho que lhe exigia superar diariamente essa timidez. Ser verdadeiramente percebido em seu ambiente de trabalho é raro.

Posso lhe ajudar?